24 de janeiro de 2019

"Se invadir meto bala", diz líder dos fazendeiros durante protesto em Marabá. Movimentos sociais acusam fazendeiro preso de ser "chefe da maior milícia armada"



Na manhã desta quinta-feira (24), os fazendeiros articulados em torno do Sindicato dos Produtores Rurais de Marabá (Prorural), fizeram discursos e armaram acampamento em uma área pública pertencente ao Departamento Nacional de Infraestrutura (Dnit), próximo à ponte sobre o rio Itacaiúnas, em frente à sede do Poder Judiciário, em Marabá, conforme informado pelo site Debate Carajás.

Em resumo, cobram do governador Helder Barbalho que impeça ocupações de terras no Sul do Pará e cobram de Jair Bolsonaro suas promessas de campanha. Como o site mostrou aqui, ao longo da campanha que o elegeu presidente da República, Bolsonaro defendeu a posse de armas - inclusive, fuzis - por parte dos fazendeiros e tratou os movimentos sociais como "criminosos". De quebra, os fazendeiros deram visibilidade a sua insatisfação e pressionaram a Justiça para que três dos seus, que estão presos, sejam liberados.



Geraldo Capota (abaixo em um registro fotográfico exclusivo do Blog do Zé Dudu), um dos líderes do movimento, garantiu ao repórter Ulisses Pompeu que "se entrarem na minha propriedade eu meto bala. Isso está na Constituição. O direito à propriedade é sagrado”.



Capota e seus pares demonstram estar irritados com a prisão dos três fazendeiros acusados de financiar e comandar milícias no sul do Pará. Alegam que o trio é inocente e que estariam apenas "defendendo suas propriedades".

Em linha com o que pensa a categoria que representa, Antônio Vieira Caetano, o "Neném do Manelão", presidente do influente Prorural de Marabá, já havia se pronunciado no mesmo sentido no dia 18 deste mês.

Neném afirmou em coletiva à imprensa, logo após a prisão do trio, que vive-se no momento "uma inversão de valores". Para ele, as ocupações de terras pelos movimentos de trabalhadores são toleradas, mas "quando o fazendeiro tenta se defender é execrado e acusado de ser chefe de pistolagem".

Os fazendeiros exigem que o governador Helder Barbalho se posicione a favor dos fazendeiros e impeça a ocupação de terras na região. Ao mesmo tempo, apesar de negarem em público, a manifestação acaba sendo um fator de pressão sobre o Poder Judiciário do Estado, no sentido de que sejam relaxadas as prisões dos três fazendeiros presos.



A Reação dos Movimentos


A resposta dos movimentos sociais veio sob a forma de uma nota oficial assinada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri), Comissão Pastoral da Terra (CPT/Pará) e Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH).

No documento, as instituições afirmam que José Iran chefia "José Iran chefia a maior milícia armada com atuação no campo na região sudeste do Pará, a serviço dos fazendeiros". Afirmam que, na Delegacia de Conflitos Agrários (DECA), "há registros de ações criminosas do grupo nas fazendas Nova Era, município de Itupiranga; fazendas Gereba e Santa Tereza, no município de Marabá; fazenda Petrópolis, no município de Tucuruí; fazenda Santa Clara, município de Parauapebas; fazendas Bom Destino, Sossego e Santa Helena, no município de Anapu, entre outras."



Segundo os movimentos sociais, a milícia age no sentido de instaurar o terror nas áreas em que atua. Simulando ação policial "espancam, queimam os barracos, motos e carros dos posseiros, ameaçam e, em alguns casos, executam as lideranças. No pacote criminoso contratado pelos latifundiários interessados está inserido um batalhão de pistoleiros, armamento pesado, roupas camufladas, explosivos e carros blindados", afirmam as organizações.

As organizações que assinam a nota afirmam que já elaboraram um dossiê completo sobre a ação da milícia que será enviado ao Conselho Nacional de Defesa dos Direitos Humanos (CNDH), Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e para o Secretário de Segurança Pública do Pará (Wallame Fialho Filho), pedindo que esses órgãos monitorem o inquérito e a ação penal decorrente dos crimes cometidos pela milícia.



Está claro que o acirramento de posições entre os movimentos de trabalhadores rurais sem-terra e os fazendeiros ameaça se tornar conflito generalizado e detonar mais uma vez este barril de pólvora. Desde o início do ano, os dois lados trocam acusações e os conflitos se multiplicam. A inércia do Incra em regularizar as terras da região e os discursos inflamados do presidente Jair Bolsonaro a favor da liberação de armas de grosso calibre para os fazendeiros, podem ser considerados os estopins a deflagrar uma crise cada vez mais iminente. A origem da crise parece estar em Brasília (ou retornando de Davos) e sua solução, muito mais distante. Viver no sul do Pará ainda é viver à sombra de um vulcão. A questão, aqui, nunca é "se"; é sempre "quando" a violência vai explodir.

Leia a seguir a nota dos movimentos sociais.


*A PRISÃO DO CHEFE DA MILÍCIA ARMADA DOS FAZENDEIROS DO SUDESTE DO PARÁ*

José Iran dos Santos Lucena foi preso no último dia 17 por policiais da Delegacia Especializada em Conflitos Agrários (DECA) de Marabá. Os mandados de prisão preventiva foram expedidos pela justiça criminal, com base nas investigações realizadas na operação longa manus. Além de José Iran foram presos ainda o filho dele, Matheus da Silva Lucena e Hamilton Silva Ribeiro.


Tão logo a imprensa divulgou a prisão do bando, as organizações de produtores rurais do Estado divulgaram nota de protesto, deram inúmeras declarações e marcaram manifestação no fórum de Marabá, condenando a ação da polícia e do Judiciário, saindo em defesa da quadrilha chefiada por José Iran e exigindo sua imediata liberdade. Para os fazendeiros, trata-se de um “pecuarista pai de família, honesto, empreendedor e que foi injustamente preso”. Mas, por que os fazendeiros reagiram de forma tão articulada e indignada contra essas prisões? A resposta é simples: José Iran chefia a maior milícia armada com atuação no campo na região sudeste do Pará, a serviço dos fazendeiros.


Na DECA de Marabá existem inúmeras ocorrências feitas por grupos de trabalhadores/as rurais denunciando as práticas violentas dos pistoleiros chefiados por José Iran. Há registros de ações criminosas do grupo nas fazendas Nova Era, município de Itupiranga; fazendas Gereba e Santa Tereza no município de Marabá; fazenda Petrópolis no município de Tucuruí; fazenda Santa Clara, município de Parauapebas; fazendas Bom Destino, Sossego e Santa Helena, no município de Anapu, entre outras. O modos operandi da quadrilha é sempre o mesmo: contratado pelos fazendeiros eles se deslocam para o local do conflito, simulam uma ação policial e utilizando um arsenal de armas dominam as pessoas, espancam, queimam os barracos, motos e carros dos posseiros, ameaçam e, em alguns casos, executam as lideranças. No pacote criminoso contratado pelos latifundiários interessados está inserido um batalhão de pistoleiros, armamento pesado, roupas camufladas, explosivos e carros blindados.

Ao dar cumprimento às ordens de prisão, a operação retirou de circulação o chefe da milícia responsável por organizar as ações criminosas encomendadas pelos fazendeiros, enfrentando uma das causas da violência no campo paraense. Por essa razão, a DECA, o MP e o Judiciário local passaram a ser alvo dos fazendeiros.

Há muito, as entidades da sociedade civil com atuação voltada ao monitoramento e acompanhamento de conflitos fundiários no campo vem denunciando publicamente a atuação de milicianos financiados por latifundiários, com objetivo de aterrorizar a vida de trabalhadores/as rurais, sobretudo, aqueles que se encontram em situação de acampamento ou em ocupações nas áreas rurais no sudeste do estado; região que concentra o maior número de conflitos e assassinatos no campo no Pará e no Brasil.

Em contraponto às pressões exercidas pelas organizações dos produtores rurais, as entidades de direitos humanos e os movimentos sociais que assinam essa nota vão encaminhar um dossiê completo do caso para o Conselho Nacional de Defesa dos Direitos Humanos (CNDH), Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e para o Secretário de Segurança Pública do Pará (Wallame Fialho Filho), entre outros, requerendo o monitoramento do inquérito e da ação penal que será aberta para julgamento dos crimes praticados pela milícia.

Belém, 23 de janeiro de 2019.


Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST.

Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará – FETAGRI.

Comissão Pastoral da Terra – CPT Pará.

Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos – SPDDH.




















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