Bolsonaro e Ernesto - Ao invés da pomba da paz, novo regime escolhe chiuaua latidor |
Mas, não é apenas isso que se pode dizer do escolhido por Bolsonaro para conduzir as Relações Internacionais. Ernesto é estridente e midiático. Adora fazer barulho nas suas redes sociais. Ernesto fez campanha para Bolsonaro e se aproximou do novo regime desde o primeiro turno. É dele um documento no qual, entre críticas ao que chama de "partidarização" das relações internacionais pelo Itamaraty, ele tece rasgados elogios ao presidente norte-americano. “O presidente Donald Trump propõe uma visão do Ocidente não baseada no capitalismo e na democracia liberal, mas na recuperação do passado simbólico, da história e da cultura das nações ocidentais”, afirma no texto.
Ernesto é de direita mas não é totalmente tapado. Sabe bem a quem elogiar para chamar a atenção. Bolsonaro é admirador confesso de Trump e já chegou a comparar-se ao presidente norte-americano.
Outro ponto que aproximou Bolsonaro e Ernesto é a crítica que ambos fazem ao que chamam de "climatismo". Segundo eles, a esquerda teria "sequestrado" as discussões sobre mudanças climáticas e "ideologizado" o tema. Ernesto, como seu chefe, dá de ombros para assuntos como "efeito-estufa", "devastação da floresta" e outros temas correlatos, tão ao agrado da maioria dos parceiros comerciais do Brasil no exterior e chega a duvidar dos estudos técnicos que apontam para as mudanças climáticas decorrentes da intervenção humana no planeta.
Em seu blog, o Metapolítica, o próximo chanceler do regime brasileiro também não poupa críticas ao Partido dos Trabalhadores (PT), sempre tratado por ele como "partido terrorista". Com isso, com certeza, marcou mais pontos com seu novo chefe.
Apesar de estar no topo da carreira, Ernesto ainda é peixe pequeno no Itamaraty. Acima do cargo que ocupa atualmente, além do próprio Ministro das Relações Exteriores, estão pelo menos o secretário-geral e nove subsecretários-gerais. Sua nomeação para Ministro, comparando com o Exército, significará que um tenente-coronel será o Comandante-Geral, passando por cima de todos os generais. Não que isso pareça importar muito para Bolsonaro, um capitão que está dando emprego para diversos generais em seu regime.
Sempre é bom registrar que antes mesmo de tomar posse, Bolsonaro já fez estragos na área internacional.
Vejam lá.
Bolsonaro afirmou que vai transferir a embaixada americana de Tel-a-viv para Jerusalém (desagradando os árabes); decidiu visitar o Chile antes de ir à Argentina, quebrando uma longa tradição diplomática; desprestigiou o Mercosul, que segundo ele deverá ser rebaixado a uma espécie de "área de livre comércio"; criticou o Acordo de Paris e chegou ameaçar abandonar o tratado; tem criticado sistematicamente a atual política ambiental brasileira, que considera "xiita" e "fábrica de multas" (o que vem causando desconforto até mesmo entre os ruralistas que temem ver seus produtos proibidos de circular na União Europeia, por exemplo); seu futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onix Lorenzoni, desqualificou as ações da Noruega, que já investiu mais de 2 bilhões de dólares na proteção da Amazônia e hoje mesmo Cuba decidiu retirar seus profissionais do programa Mais Médicos (mais de 7 mil médicos cubanos atuam no país, em especial nas cidades que antes não tinham cobertura através do SUS e que voltarão a ficar sem médicos).
A China, principal parceira comercial do Brasil, já demonstrou seu desagrado com a aparente preferência de Bolsonaro por Taiwan (considerada província rebelde pelo governo chinês) e com as reiteradas críticas que o presidente eleito faz ao que chama de "invasão de produtos chineses" no mercado brasileiro.
Como se vê, o amplo e automático (e até agora, sem qualquer compensação visível) alinhamento à política internacional norte-americana terá consequências e nem todas serão agradáveis.
Por tudo isso, era esperado que Bolsonaro escolhesse alguém com um perfil que apontasse para a moderação e que ajudasse a modular a linguagem belicista do presidente. Ao escolher Ernesto, o presidente eleito aponta exatamente para o sentido oposto. Ao invés de escolher uma pomba da paz, prefere escalar um chiuaua latidor com pretensões midiáticas.
Para nós brasileiros, os tempos serão estranhos. Mas, não será muito diferente para os estrangeiros. Eles vão precisar se acostumar com uma postura brasileira que se espera agressiva e francamente pró-Trump. Celebrado como promotor da paz desde Haia em 1907, o Brasil participa, como observador, do Movimento dos Países Não-Alinhados, criado como alternativa ao alinhamento automático aos EUA ou à extinta União Soviética e sempre esteve entre os países considerados multilateralistas e que exercem o chamado "soft power" - influência regional sem uso de força militar.
A equidistância entre extremos sempre norteou a política externa brasileira, mesmo durante a Ditadura Militar e agora o novo regime brasileiro ameaça alinhar o país com a chamada "direita ultra-nacionalista" formada por mandatários claramente autocratas ou aspirantes a sê-lo como Trump (EUA), Orbán (Hungria), Savini (Itália) e Duterte (Filipinas). Por onde se vê, o multilateralismo que triunfou a partir do fim da Guerra-Fria, no final dos anos 80, passará por suas maiores provas nos próximos anos e um novo triunfo nunca foi tão incerto.
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