1 de janeiro de 2012

Cientista político analisa cenário estadual e diz que "corrida eleitoral" já começou



O Diário do Pará de hoje apresenta uma longa entrevista com Roberto Corrêa (na foto do Uol acima), na qual o cientista político paraense analisa o cenário estadual e afirma que o "PT é uma reunião de facções que se odeiam", que a Lei da Ficha Limpa "atrapalhou o processo democrático", que Almir Gabriel (PTB) e Edmilson Rodrigues (PSOL) não podem ser "subestimados" e que Marinor Brito, ocupante até a semana passada da vaga de Jader Barbalho no Senado, não pode posar de "heroína da moral". 
Leia a íntegra abaixo.
O cientista político Roberto Corrêa, professor da Universidade Federal do Pará, acompanha o cenário político paraense há várias décadas. Pesquisas, análises de discursos e estratégias de campanha são alvos de seus estudos, que chegam à mesma conclusão: o recente sistema democrático brasileiro ainda precisa ser aperfeiçoado, pois atualmente as instituições jurídicas sofrem influências políticas e acabam tomando decisões baseadas em interesses. No Pará, não é diferente, garante. Após mobilizar toda a sociedade na discussão sobre a possível criação de dois novos Estados, o plebiscito de dezembro mostrou que novas lideranças vêm ganhando espaço e já se organizam para as eleições de 2012. Em entrevista às repórteres Cintia Magno e Thaís Corrêa, ele compara o pleito eleitoral à corrida de cavalos cuja largada já foi dada.

P: Como o senhor avalia os últimos acontecimentos na política paraense?
R: Primeiro devemos analisar desde as eleições de 2010. Toda eleição majoritária é aquela que se define apenas um candidato, que assumirá o cargo definido, e estes processos se assemelham a corridas de cavalo. Primeiro aparecem vários cavalos, candidatos, mas depois o eleitor, como as pesquisas mostram, tem uma noção do que vai acontecer. E isso significa que posteriormente, no segundo turno, ficam apenas os dois candidatos com mais espaço na mídia, infraestrutura e votos. Em 2010, estes dois candidatos foram Ana Júlia, então governadora, e Simão Jatene, que foi o vencedor da disputa. Isso, porém, já era previsto. Não que a Ana Júlia não tenha feito um bom governo.Ninguém consegue fazer um governo ideal, mas é preciso que a construção coletiva, a base, tenha uma certa harmonia, o que não existe no PT. O PT não é como o PMBD, uma coalizão. Ele é, na verdade, uma reunião de facções, que até se odeiam e acabam prejudicando que está, por acaso, à frente, que era o caso de Ana Júlia. Isso demonstrou que houve uma renovação no jardim secreto do PSDB. Em 2006, esse mesmo jardim ficara dividido entre aqueles que queriam o Almir e os que apoiavam o Jatene. A divisão interna leva então que isso apareça no complexo eleitoral dos sentimentos ocultos.
P: E a saída do Almir do PSDB e depois seu sucessivo apoio a diferentes partidos, pode ser encarado como?
R: Ele estava tentando experimentar. Ao apoiar Ana Júlia, ele fazia aquilo para que o Jatene não ganhasse com uma proporção tão grande de votos. E isso deve ter influenciado. Porque tanto o Jatene como o Almir são construções coletivas. Existe no povo pessoas que os condenam e os admiram.
P: Quais outros acontecimentos dessa eleição trouxeram impactos para o cenário atual?
R: O mais peculiar da última eleição foi a [Lei da] Ficha Limpa, porque foi um projeto que deixou o eleitor confuso e acabou atrapalhando o processo democrático. Isso porque ele não sabia se o candidato teria ou não os votos contabilizados. Por isso, com medo de perder o voto, ele votava nulo ou num segundo candidato. Aconteceu com muitas pessoas. Por isso, jamais poderíamos saber como seria se isso não tivesse sido instituído. Vemos apenas que estes candidatos começaram, então, a cair nas pesquisas. Foi o que aconteceu com o Jader, por exemplo, que tinha antes nas pesquisas uma vantagem maior em relação ao segundo candidato, que era então o Paulo Rocha, do PT. Após discussões sobre sua validade, os candidatos que haviam sido enquadrados na legislação conseguiram se recuperar e assumir os cargos, mas como o Jader é uma figura nacional, ele pagou um preço mais caro por isso. Resumindo, a Ficha Limpa atrapalhou a pureza de uma eleição. Ao final, Marinor Brito (PSOL) e Jader Barbalho foram prejudicados, ainda que, ela tenha ganhado mais visibilidade no tempo em que passou no Senado.
P: E a postura do Tribunal Regional Eleitoral no Pará nos últimos julgamentos?
R: O TRE sempre agiu certo. Mas o Tribunal Superior Eleitoral [TSE] trabalha na mira da mídia e com mais pressão nacional. É preciso ter coragem de dizer que essas instâncias da Justiça não justicializam a política e sim a política que entra na Justiça. Porque o alcance de méritos, cargos maiores, nessas esferas, se dá com apoio político. Isso é algo que vai ter que ser revisto. O aprimoramento das instituições brasileiras vai ter que ser revisto, para evitar traumas. É preciso garantir que aquelas pessoas que vão ser sabatinadas pelos pares possam ser sabatinadas também pela sociedade civil. Para que a coisa não seja feita no âmbito do político, mas também no âmbito das excelências do saber jurídico, como a Ordem dos Advogados no Brasil [OAB]. Apesar dos problemas que houve aqui no Estado, ela continuará sendo uma instituição de respeito pela sua história. E outros atores da sociedade civil, como o Ministério Público, que desde a Constituição de 1988 é uma conquista da população brasileira.
P: Em dezembro, o Pará todo foi às urnas para opinar sobre a divisão do Estado. Como fica a política paraense depois do plebiscito?
R: O plebiscito cai como uma luva que diferencia os três grandes dedos que são os três Parás: o Pará testemunha, o isolado e o transplantado. Todos os três têm suas lideranças e são elas que vão ditar a campanha municipal de 2012. Esta configuração não define ainda o que vai acontecer, mas é uma fotografia inicial decorrente do processo eleitoral de 2010. Nas outras regiões acontece de forma semelhante. Na verdade, nas análises que fiz, é possível perceber quem é quem no Estado. As pessoas que aparecem são aquelas que têm ativos de poder transpostos em voto. Ou seja, o plebiscito já está influenciando na escolha dos candidatos.
P: O que devemos esperar das eleições para prefeito de Belém?
R: Sobre os possíveis concorrentes que eu já citei, a maior dúvida é sobre o posicionamento do PSDB, se ele vem com candidato próprio ou participará de coligação, e do PT, que escolhe se vem com uma candidatura à esquerda, como a do Edmilson. Acho difícil que Ana Júlia venha para prefeita. Ela acaba de assumir um cargo federal. Ela tem que se preservar para tentar vir como governadora ou senadora. O certo é que não podemos subestimar o Almir e o Edmilson.
P: O senhor acredita que o PSOL terá fôlego e recursos para uma campanha de sucesso?
R: Na minha experiência, os recursos aparecem como caudal de uma liderança aceita. O José Sarney disse uma vez para o Lula: “quando você está na frente nas pesquisas, é mais quem aparece para te ajudar”. A não ser quando os três cavalos estão empatados. Aí sim, os grupos de interesse se mobilizam em torno daquele cavalo que está mais próximo dos seus valores.
P: O tempo que a Marinor ficou no Senado pode influenciar como auxílio à campanha do Edmilson, já que eles são do mesmo partido?
R: Não acho que ela tenha esse poder. Ela não pode tentar ser a “heroína da moral”, porque isso traz um desgaste muito grande. O que as pessoas querem em Belém é ordem e previsibilidade. Não há espaço para pessoas que falem mal dos outros. Candidatos que se agridem em vez de tratar dos problemas da cidade saem perdendo. 

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